sábado, 18 de abril de 2009

Paloco, Potas e Costeletas à Javali

A culinária, a arte de cozinhar e misturar alimentos e condimentos; a arte de inovar processos de digestabilidade; de aliar sensações do paladar  à necessidade biológica da alimentação, é nos nossos dias digna de tanto respeito quanto qualquer outra arte, ou ainda mais. Hoje os cozinheiros são elevados a mestres e os restaurantes ( do melhor ao menos mau) feitos santuários.

Ao mesmo tempo, hoje é a hora em que a figura de "gato por lebre" mais sentido faz. É fácil perceber que face à necessidade absurda de fazer dinheiro fácil , a que esta sociedade nos coage, muitos restaurantes ( e os homens e mulheres por detrás deles) nos servem, não gato por lebre (ninguém seria capaz de sacar a pele ao bichano e partir-lhe os ossinhos todos), mas paloco por bacalhau (porque ninguém tem um paloco em casa a vomitar bolas de pêlo), pota por polvo (não se vê em nenhum livro de crianças uma pota a brincar com um novelo de lã) ou costeleta dum porco grande por costeleta de javali (normalmente nem há fingimento, o nome do prato chama-se costeleta à javali na brasa e não costeleta de javali na brasa). Ora, a minha questão,  embora não saiba ainda bem qual ela é, será sempre pertinente. E das duas uma, ou quero que realmente se coma aquilo que vem no cardápio ou então quero experimentar comer gato. 

Gosto imenso de um civet de lebre, não sei como seria de gato, porque tenho a certeza que nunca o serviram como lebre, mas também tenho a certeza que já me serviram coelho por lebre, que me serviram paloco por bacalhau, pastéis de batata por pastéis de bacalhau, salada e arroz de tentáculos de pota por salada e arroz de polvo, cascas de restos de caranguejo e delicias do mar(que são restos de caranguejos) por cascas de sapateira, fracas por faisões, e etc... etc...

Acho que a questão é a seguinte, ou começamos a comer tudo aquilo que lá está escrito, ou então partimos do pressuposto que tudo é gato por lebre, isto tudo, por uma questão de coerência. Portanto ao pedir lebre quero mesmo comer gato, ao pedir bacalhau quero mesmo é um paloco à Zé do Pipo.

Parem de brincar com as nossas papilas gustativas e com o nosso palato.

Ferran Voltaren

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